Marcelino Eduardo da Silva: O Mestre Paizinho

A Semana Santa começava. Eram outros tempos. Na Sexta-feira da Paixão, comer carne vermelha nem pensar. Álcool, Deus me livre. Conheci pessoas que diziam que era proibido até “banhar” no dia da morte de Jesus. Muitos se aproveitavam disso. Era tempo de ver a Porca de Bobes” debaixo da ponte que liga o Paraíso das Aves à Rua de Baixo, de ver a mulher de branco perto do cemitério. Quem não tinha um conhecido ou conhecida que virava lobisomem nesses tempos? Era tempo de ver “livusia”.

No Sábado de Aleluia a Igreja Matriz lotava. Era menino dando na canela. Muitos nem sabiam o que Bispo tava falando e não viam a hora de acabar a celebração. Mas tudo isso tinha uma razão. Era a noite da queima do Judas na Praça do Abrigo. “Ides em paz e o senhor vos acompanhe”. Pronto, acabou a missa. A multidão saía em procissão em direção à praça onde hoje é o Fórum de Justiça. De longe já se via um boneco com roupas velhas e os sapatos brilhosos em cima de um estrutura de ferro. De repente alguém gritava: já vai começar, tomem muito cuidado. Era o Mestre Paizinho, que por muitos anos nos deu essa alegria.

Um fio de pólvora que era ligado até o boneco do Judas era aceso. Era questão de segundos. O boneco começa a pegar fogo e girar ao mesmo tempo até explodir. Era um barulho muito forte. Começava uma correria pra ver quem pegava o sapato de Judas. Era muito bom.

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Depois disso tudo era hora de ir tomar um guaraná com a família no bar Água Viva da Praça do Relógio, ir para casa dormir e acordar às 4h da manhã pra ver os caretas.

Paizinho foi um dos maiores artesãos da nossa região. Um homem que não fazia apenas bonecos. Em um pequeno quarto em sua casa do bairro São Félix, Paizinho fazia violões, rabecas, flautas, cavacos. Era um mestre.
Paizinho morreu em 1992 e a tradição da queima do Judas morreu junto com ele.

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