A difícil arte do MDB em manter relevância sem a vice na chapa de Rafael Fonteles

No tabuleiro político do Piauí, nada é apenas o que parece. A confirmação, feita pelo senador Marcelo Castro, de que o MDB não terá mais a vaga de vice na chapa majoritária governista em 2026 expõe uma questão que vai além do cargo em si: trata-se de medir até onde vai a capacidade de sobrevivência de um partido historicamente acostumado a exercer influência no coração do poder estadual.

Ao admitir que o posto ficará com o PT, o governador Rafael Fonteles sinaliza um movimento calculado: fortalecer a presença de seu próprio partido no núcleo central da chapa, reduzindo a margem de negociação de aliados. O gesto, ainda que revestido de naturalidade, atinge diretamente o vice-governador Themístocles Filho, figura que durante décadas acumulou funções de relevância na política piauiense e que hoje se vê diante do risco de perder o espaço mais visível que já ocupou no Executivo.

O MDB, por sua vez, tenta não dramatizar a perda, mas sabe que a saída da vice é mais que simbólica. A posição de número dois na hierarquia estadual, mesmo sem o peso decisório do governador, carrega visibilidade, acesso e capacidade de articulação. Perder esse assento significa reduzir o alcance do partido dentro da engrenagem de governo, algo que Marcelo Castro reconhece ao falar em “compensação política”.

As conversas de bastidor levantam três cenários possíveis para o futuro de Themístocles. O retorno à Assembleia Legislativa, onde por anos exerceu a presidência, esbarra em obstáculos concretos: a força do PT, que tende a ampliar sua bancada, e a presença de Severo Eulálio, seu correligionário, que trabalha pela própria permanência no comando da Casa. Não menos relevante, a cadeira que simbolizaria o retorno já pertence a Felipe Sampaio, filho do próprio vice, o que limita o campo de manobra.

Outra alternativa, aventada nos corredores palacianos, seria a condução de Themístocles a uma secretaria estratégica em eventual segundo mandato de Rafael Fonteles. Tal saída garantiria ao emedebista uma posição de prestígio, sem o desgaste de disputar terreno legislativo. Mas dependeria, em última instância, da disposição do governador em oferecer mais do que um aceno de boa vontade.

Há ainda a hipótese, talvez a mais silenciosa e estratégica, de uma indicação para o Tribunal de Contas do Estado. O movimento dependeria de um rearranjo futuro na Corte, com a possível aposentadoria de conselheiros, e abriria espaço para que o MDB transformasse a perda imediata em um ativo de longo prazo.

O silêncio de Themístocles, nesse cenário, diz mais que qualquer declaração pública. É a pausa calculada de quem sabe que a política não se faz apenas com gestos imediatos, mas com paciência e tempo, atributos que sempre marcaram sua trajetória.

Para o MDB, a questão vai além da figura do atual vice: é sobre a manutenção de sua relevância histórica em um governo no qual o PT cresce em musculatura e apetite. A saída da vice-governadoria não representa apenas uma mudança na chapa; é o prenúncio de uma redistribuição de poder em que cada compensação, cada cadeira negociada, definirá se o partido continuará a ser protagonista ou se passará a desempenhar um papel secundário no futuro político do Piauí.

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