A presidente Dilma Rousseff obteve uma vitória significativa em sua luta para manter-se no cargo após ser beneficiada por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) sobre como deve tramitar o processo de impeachment.
A maioria dos ministros votou que o Senado pode derrubar eventual decisão da Câmara dos Deputados de abrir um processo contra Dilma. Isso garante uma etapa a mais que pode dificultar o impedimento, já que a base do governo é mais fiel no Senado do que na Câmara.
A corte também decidiu anular a votação secreta que elegeu na semana passada a chapa oposicionista para ocupar a maioria das vagas da Comissão Especial da Câmara que vai emitir um parecer a favor ou contra a continuidade do trâmite de impeachment. Eles consideraram que o correto é cada partido político escolher seus representantes internamente.
A ação questionando o Supremo sobre o rito de impeachment foi movida pelo PCdoB, partido da base do governo. Considerando os principais pedidos da ação, houve uma derrota quando a maioria do STF decidiu que Cunha não era obrigado a ouvir a defesa de Dilma antes de tomar a decisão de iniciar o trâmite do impeachment. Já se sabia que era improvável que o Supremo acolhesse essa tese.
Relator do caso, o ministro Edson Fachin saiu derrotado em todas as questões polêmicas. A maioria dos ministros acompanhou o voto de Luís Roberto Barroso, que procurou seguir nas suas decisões o rito que foi adotado no impeachment de Fernando Collor, em 1992.
Entenda melhor o significado das decisões do STF:
1) Palavra final do Senado
A Constituição Federal prevê que a Câmara dos Deputados decide se um processo deve ser aberto contra a presidente e que o Senado instaura o processo e a julga. Caso o processo seja iniciado, Dilma deve ficar afastada do cargo por até 180 dias para não poder interferir no julgamento.
O questionamento que foi trazido ao STF era se eventual decisão da Câmara implicava em imediata abertura do processo no Senado ou se os senadores poderiam optar por não dar prosseguimento ao impeachment.
Oito dos onze ministros decidiram que a Câmara apenas autoriza a abertura do processo, mas o Senado depois é que decide se o inicia de fato, caso a maioria simples assim quiser.
Votaram nesse sentido Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Votaram contra Edson Fachin, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.
“Não há sentido de que numa matéria de tamanha gravidade estabeleça-se uma subordinação do Senado em relação à Câmara”, disse Celso de Mello.
No caso de Collor, a decisão da Câmara foi confirmada em votação simbólica das lideranças dos partidos no Senado. A decisão do STF agora estabelece a exigência de uma votação formal. Isso é favorável a Dilma porque prevê mais uma etapa para o processo de impeachment na casa onde o apoio a ela é mais sólido.
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), tem sido fiel ao governo e na quarta-feira inclusive trocou farpas com o vice-presidente Michel Temer.
Ainda assim, o objetivo principal do governo continua sendo tentar barrar o trâmite do impeachment ainda na Câmara.
Vale lembrar que a votação na Câmara exige apoio de dois terços (342) dos 513 deputados para que a abertura de processo seja autorizada. No Senado, porém, o STF decidiu que basta apoio da maioria simples dos 81 senadores para confirmar tal decisão. Já no julgamento final no Senado, caso o processo venha a ser aberto, Dilma só é cassada se dois terços (54) dos senadores votarem nesse sentido.
2) Eleição para Comissão Especial anulada
Já a primeira etapa do trâmite do impeachment no Congresso – a eleição dos 65 deputados que formarão uma Comissão Especial para emitir uma parecer recomendado ou não a abertura de fato de um processo – foi alvo de intensa disputa política entre governo e oposição, culminando em uma tensa votação no plenário da Câmara na terça-feira da semana passada, com direito a urnas quebradas e agressões de ambos os lados.
Essa comissão deve ter representantes de todos os partidos, que têm mais ou menos vagas de acordo com o tamanho de suas bancadas – PT e PMDB são os maiores e têm direito a oito cada, por exemplo.
A princípio, os líderes dos partidos na Câmara indicam os representantes de cada legenda. No entanto, a perspectiva de o líder do PMDB, Leonardo Picciani, escolher apenas nomes contrários ao impeachment levou parte do seu partido a se articular com a oposição e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, para lançar uma chapa independente de candidatos à comissão.
Por decisão de Cunha, a votação foi secreta, com objetivo de permitir a parlamentares da base governista trair o governo sem risco de retaliação. O resultado foi que a chapa oposicionista levou a disputa com 272 votos contra 199 em apoio à governista.
A maioria dos ministros (7×4) votou que o correto é que os partidos escolham internamente os nomes que serão indicados, por meio de seus líderes. Saíram vitoriosos Barroso, Zavascki, Weber, Fux, Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Lewandowski. “Ante à ênfase dada pela Carta (Constituição) aos partidos políticos, não há campo para ter-se candidatura avulsa”, destacou Marco Aurélio.
Do outro lado ficaram Fachin, Mendes, Mello e Toffoli, este último o que mais se exaltou em sua argumentação. Para ele, não é correto que os líderes partidários decidam no lugar da totalidade dos deputados. “Nós estaríamos tolhendo a representação popular”, disse, ao tentar convencer os demais, sem sucesso.
Seis dos onze ministros também condenaram o recurso ao voto secreto.
Sem defesa prévia
O PCdoB argumentou na ação que a presidente Dilma Rousseff deveria ter tido direito à defesa prévia antes de Cunha tomar sua decisão sobre o início do trâmite do impeachment.
O advogado do partido na causa, Cláudio Pereira de Souza Neto, argumentou que a legislação penal avançou nos últimos anos no sentido de garantir maior direito à defesa aos denunciados, e que o mesmo deveria ser adotado no caso de um julgamento ainda mais grave como um processo de impeachment.
No entanto, houve consenso entre os ministros no sentido de que Dilma terá oportunidade de se defender ao longo da tramitação do impeachment no Congresso. Além disso, segundo eles, era importante manter o mesmo procedimento do impeachment de Collor, para garantir segurança jurídica.
A derrota do PCdoB neste ponto não chega a ser negativa para a presidente, porque, caso a decisão fosse inversa, tornaria ainda mais lenta a tramitação do impeachment, e a estratégia atual do governo é tentar acelerar esse processo. O objetivo é tentar vencer a disputa rapidamente para superar a instabilidade política e dar novo fôlego à administração petista.
Fonte: Terra