Faleceu na madrugada desta quarta-feira (4), aos 92 anos, a renomada arqueóloga Niède Guidon, considerada uma das mais importantes pesquisadoras da história do Brasil, reconhecida internacionalmente e defensora do Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí. A causa da morte não foi divulgada.
Responsável por descobertas marcantes no Parque Nacional da Serra da Capivara, Niède Guidon dedicou décadas de sua vida à arqueologia e à preservação do patrimônio pré-histórico brasileiro. Seu trabalho foi fundamental para demonstrar que a presença humana nas Américas pode ser muito mais antiga do que se imaginava, desafiando teorias consolidadas sobre o povoamento do continente.
A contribuição de Niède ultrapassou os limites da ciência: ela foi uma defensora incansável da cultura, da educação e do desenvolvimento sustentável no semiárido piauiense. Seu legado permanece vivo nas instituições que ajudou a fundar, como o Museu do Homem Americano e a Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM).
Niède Guidon morre às vésperas das comemorações do aniversário de 46 anos do Parque Nacional da Serra da Capivara. O velório deve ocorrer no Museu do Homem Americano ou no Centro Cultural de São Raimundo Nonato. Um dos desejos expressos por Niède era ser sepultada no jardim de sua residência, na mesma cidade.
Em nota, o Museu da Natureza enalteceu o legado da pesquisadora, destacando seu papel transformador na arqueologia e no fortalecimento da identidade cultural brasileira.
A Prefeitura Municipal de Coronel José Dias lamentou a morte da arqueóloga Niède Guidon e decretou luto oficial de três dias. Parte do território do Parque Nacional da Serra da Capivara está localizada no município, que reconhece a importância do trabalho deixado pela pesquisadora para a história, a cultura e o desenvolvimento da região.
Nota de pesar da prefeitura de Coronel José Dias
A Prefeitura Municipal de Coronel José Dias recebe com profunda tristeza a notícia do falecimento da Dra. Niède Guidon, uma pessoa essencial e inesquecível na história do nosso município, do Brasil e do mundo.
Com coragem, visão e dedicação incansável, Dra. Niède foi a grande responsável por revelar ao mundo a grandiosidade arqueológica do nosso território, lutando com firmeza pela criação, preservação e valorização do Parque Nacional Serra da Capivara, patrimônio que transformou Coronel José Dias em referência turística.
Seu trabalho ultrapassou os limites da ciência e da arqueologia. Seu legado permanecerá vivo entre nós, nas trilhas do Parque, nas mãos dos artesãos e operadores do turismo, no saber transmitido às novas gerações.
Neste momento de luto, prestamos nossa mais sincera homenagem e nos solidarizamos com familiares, colegas e admiradores dessa mulher extraordinária.
Coronel José Dias é eternamente grato à grande guardiã da Serra da Capivara.
O município decretará luto oficial de 3 dias.
A Prefeitura de São Raimundo Nonato também manifestou pesar pelo falecimento da arqueóloga, expressando gratidão por sua imensa contribuição ao município e à ciência.
Quem foi Niède Guidon
Niède Guidon foi uma das mais importantes arqueólogas da história brasileira e mundial. Ela realizou pesquisas arqueológicas no Piauí, sendo responsável pela descoberta de mais de 800 sítios pré-históricos e vestígios dos primeiros habitantes humanos do continente. Grande parte dessas descobertas ocorreu em escavações realizadas em abrigos rochosos naturais com pinturas rupestres, no Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí — área declarada Patrimônio Mundial pela UNESCO em 1991. Desses sítios, mais de 600 contêm pinturas rupestres.
A teoria de Guidon sobre a chegada do homem às Américas rompeu com o consenso científico tradicional da arqueologia, amplamente dominado por pesquisadores norte-americanos, que defendem que os primeiros seres humanos teriam chegado ao continente há cerca de 13 mil anos, vindos da Ásia, atravessando o Estreito de Bering (entre a Sibéria e o Alasca) e migrando em direção ao sul.
Com base nas escavações no Piauí e nas datações realizadas na Serra da Capivara, Guidon propôs uma hipótese alternativa: os primeiros humanos teriam chegado às Américas vindos da África, há muito mais tempo do que se supunha. Segundo artigo publicado por ela em 2008, na revista da FAPESP, o material arqueológico resgatado até o início dos anos 2000 indicaria que o homem teria chegado à região há cerca de 100 mil anos.
Niède Guidon atuou por cinco décadas na região, sendo a principal responsável pela estruturação científica e institucional do parque. Foi fundadora e diretora-presidente da Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM) e nomeada como presidenta emérita da instituição.
Em reconhecimento à sua contribuição científica e cultural, Niède foi agraciada com diversos títulos e homenagens. Em 2018, recebeu o título de Doutora Honoris Causa pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF). Também foi homenageada pela Universidade Federal do Piauí (UFPI) com o mesmo título — o mais importante concedido por uma universidade a personalidades que se destacam por sua contribuição à ciência, à cultura ou à humanidade.
Em 2024, Niède Guidon foi vencedora do Prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia — uma das maiores honrarias da pesquisa científica no Brasil — concedido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), em parceria com a Marinha do Brasil.